segunda-feira, 27 de setembro de 2010

"Ah", observou o terapeuta imediatamente, "você pensa que deve ter medo desses impulsos sanguinários. Bem, esse é apenas um segundo erro de sua parte. O suicídio é sempre apenas um erro, no sentido de utilizar um recurso inadequado. Você se sente compelida a efetuar um corte físico em seu corpo. É um ímpeto para ver seu sangue correr, porque você ainda não ousaria abrir seu coração e deixar seus sentimentos fluírem. Você gosta de mim porque eu tento apoiá-la".

Essas explicações foram rapidamente seguidas por uma enorme diminuição da sua tensão. "Se você diz isso, talvez eu possa tirar o nariz de toda esta sujeita e respeitar um pouco mais livremente. Mas pode alguém gostar realmente de você? Isso não é pedir demais? Se eu ficar dependente de você, não serei um peso?"

"E uma pequena criança, cada recém-nascido, não tem legítimo direito ao cuidado dos pais? E você, que no seu mais íntimo ser é uma pequena criança, não teria um duplo direito de ser protegida, por ter sido dolorosamente privada do que tanto necessitava tempos atrás, no momento certo, quando era fisicamente pequena? Não seria correto você ser agora amplamente recompensada por isso?"

Para fazer essas afirmações, o terapeuta recorreu ao material biográfico que ela lhe havia fornecido, que revelavam o fato de que sua mãe fora alguém muito eficiente, tendo transformado sua própria casa em uma hospedaria. Estranhos necessitados, oitenta ou noventa a cada vez, eram acolhidos e cuidados na casa. Era somente para seus próprios filhos que a mãe não tinha tempo. A paciente ficou tocada com esse convite. No dia seguinte, trouxe sua mamadeira novamente, e deixou-se de novo ser uma criança pequena. Seu próprio comentário foi o seguinte: "Quando estou assim, sou realmente eu mesma. Agora não tenho mais nenhum barulho ou vozes em meus ouvidos. Foi muito exaustivo ter que ouvir tal dínamo de sons vindos do além".

Por duas semanas nada mais ocorreu, exceto que a paciente deitava-se na posição fetal e era alimentada com a mamadeira pelo analista. À noite, dormia maravilhosamente bem, oito ou nove horas seguidas. "Esta permissão de ser uma criança pequena é como uma base firme para mim, um chão sólido onde eu posso me estabelecer. Se você não me tivesse possibilitado isso na semana passada, sei que teria enlouquecido para sempre.

Realmente necessito ter uma base sólida como essa antes de ousar deixar-me envolver por sentimentos mais intensos. E eu preciso saber que posso voltar sempre para essa base, caso as coisas se tornem muito difíceis. Ou terei que ficar sem isso de uma só vez logo que crescer? Ao dizer isto, seus olhos abriram-se em uma expressão horrorizada."

O terapeuta confortou-a imediatamente. "Não se preocupe em crescer. Apenas se permita ser exatamente o que você é, tão inteiramente quanto possível e por quanto tempo quiser. Se seguir esse conselho, o amadurecimento vai se dar por si mesmo, no devido tempo".

Ao ouvir essas palavras, o medo surge novamente em seu rosto. Depois dessa fase terminou a sessão com um misto de espanto e de apreensão: "Ah, agora esses sentimentos por você estão aflorando novamente".

Na noite seguinte, teve um sonho muito obsceno e incestuoso com seu pai. Falou do sonho, no dia seguinte, de forma tão casual e desafetada que era de se suspeitar. Além disso começou, repentinamente, a discutir um assunto médico. Algumas horas depois, telefona em um estado desesperador: "Quando eu estava indo embora hoje, tive uma sensação misteriosa. Quando estava falando aquelas coisas médicas, não era eu que estava lá. Quem estava falando era uma enorme mulher estranha, parada de pé a meu lado. Eu me perdi novamente naquele papel tão artificial de médica adulta, e o pior de tudo é que não conseguia mais vê-lo, apesar de você ter me dado a mão quando fui embora. Tive a sensação de ter repentinamente perdido a ambos, meu pai e minha mãe. Eu estava novamente tentando enganar-me, e fazer o papel do grande adulto. Depois da sessão, fui à cidade comprar algumas roupas bonitas para poder ficar atraente para alguém, mas havia um homem parado diante da loja para a qual me dirigi. Ele olhou para o prédio e escreveu algo em uma caderneta. Sei que escreveu algo a meu respeito e sobre o que pretendia fazer, e ele tinha que relatar isso à polícia. Fiquei terrivelmente assustada e corri atabalhoadamente para casa. Então aquela terrível tensão voltou a meus ouvidos e também aquelas dores de cabeça na base do crânio, como se ela fosse explodir. E ouço os barulhos de dínamo novamente, e tenho que escutar cada carro que passa para descobrir o significado pavoroso que ele tem. Estou toda presa a meus ouvidos novamente!"

Ajudado por sua experiência anterior com a paciente, o analista pôde dizer: "Talvez essas sensações que você teve com relação a mim, e que você teve por seu pai durante o sonho, assim como seu desejo de ter roupas bonitas e de ser atraente, ainda sejam um tanto grandes demais e incontroláveis para você. Não acho que a pequena menina, que você realmente é, já possa começar a enfrentar essas sensações. Talvez seja melhor você não fazer nada, ou querer começar a fazer nada, ou querer começar a fazer algo, sem antes perguntar à pequena menina dentro de você se está bem para ela". Assim que ela se permitiu ser uma criança novamente, a sensação de segurança voltou e as manifestações psicóticas desapareceram.

Mais ou menos nesse período, os desenhos bidimensionais da paciente e suas pinturas foram substituídas por uma modelagem tridimensional. No início, ela se mantinha continuamente obrigada a modelar uma figura feminina na forma de um rígido crucifixo. (Fig. 13.) Assim que foi terminada, essa modelagem transformou-se (aparentemente de forma espontânea em suas mãos) em uma graciosa dançarina. (Fig. 14). Repentinamente, a cruz e a dançarina lutavam por um lugar em seu mundo. Como ela poderia resolver esse conflito por meio da argila? A solução veio somente bem mais tarde, em um exercício de meditação planejado pela própria paciente, quando ela repentinamente se deu conta de que Deus penetra em tudo, mesmo em uma dançarina prostituta.

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